A liberação de recursos das contas ativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS ), medida que será anunciada nesta quinta-feira pelo governo Jair Bolsonaro , não deve afetar o volume de dinheiro do Fundo de Garantia usado para financiar a casa própria. O compromisso foi dado por integrantes do governo federal segundo o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins.
- Eles disseram que vão liberar recursos de um lado, mas compensar de outro. Ainda não sei detalhes, mas tivemos o compromisso de que os recursos para financiamento da casa própria não serão afetados - disse Martins ao GLOBO.
O executivo da CBIC lembra que do total de R$ 78 bilhões do orçamento do FGTS em 2019, cerca de R$ 69 bilhões serão destinados à habitação.
- Já é um número 5% inferior ao que foi destinado ano passado. Se considerarmos a inflação, em valores reais, a queda é um pouco maior. Não tem sentido descapitalizar o FGTS - afirmou o presidente da CBIC.
Para Martins, um governo que lutou para incluir a capitalização na proposta de reforma da Previdência, como uma nova forma de poupança para a aposentadoria, não pode abrir mão dos recursos do FGTS, uma das poucas fontes de poupança do país.
- O FGTS é uma das poucas fontes de poupança do país. Não acredito que este governo vá abrir mão dela, já que o próprio governo queria a capitalização como uma nova forma de poupança para a aposentadoria - disse Martins.
O presidente Jair Bolsonaro confirmou, nesta quarta-feira na Argentina, a liberação de recursos do FGTS. Segundo ele, a medida é uma "pequena injeção na economia".
Ceticismo
Daniele Akamine, advogada especialista em economia da construção civil, é cética em relação a uma possível compensação do governo ao esvaziamento do FGTS. Para ela, no atual quadro de crise fiscal, isso dificilmente vai acontecer, já que não há recursos.
- Se o governo tem recursos para compensar os saques do FGTS, poderia injetar esse dinheiro diretamente na economia para estimulá-la sem mexer com o FGTS - disse a advogada.
A advogada observa que nos últimos três anos, 44% dos lançamentos do programa Minha Casa, Minha Vida foram financiadas com os recursos do FGTS. Akamine afirma que mesmo no Sistema Financeiro de Habitação (SFH), nos imóveis de até R$ 1,5 milhão, também são usados recursos do FGTS para financiamento.
- O governo vai apagar um incêndio na economia, mas cria um problema na habitação. Como os empresários vão investir nesse setor se os recursos para financiamento da casa própria estão sendo esvaziados?
A professora de economia do Insper, Juliana Inhasz, observa que o FGTS é uma espécie de poupança compulsória para a compra da casa própria. Ela afirma que, com os recursos do fundo, muitas famílias que não têm ideia de planejamento ou educação financeira conseguem dar uma boa entrada no imóvel próprio.
- O risco é de as pessoas resgatem seus recursos do fundo e gastarem sem qualquer planejamento. Mesmo com rendimento baixo, o FGTS acaba sendo usado para um objetivo importante na vida das pessoas, especialmente as de renda mais baixa, que é a compra da casa própria. É um jeito compulsório de o brasileiro, que não tem educação financeira, fazer uma poupança - diz.
Recursos ociosos
Para o economista Pedro França, da consultoria GO Associados, dificilmente o governo poderá fazer algum tipo de compensação aos saques do FGTS com recursos do Tesouro. Ele avalia que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por exemplo, poderia ser utilizado para isso.
França observa que ao limitar os saques das contas ativas do FGTS em até 35% o governo evita que faltem recursos para financiar habitação no curto prazo. O economista ressalta que os últimos dados disponíveis do FGTS mostram que havia sobra de recursos que não estavam empenhados em financiar habitação.
-No fim de 2017, os últimos dados disponíveis do FGTS, mostram que havia R$ 24 bilhões que não estavam empenhados em financiamento habitacional. Portanto, há recursos ociosos e por isso o governo está fazendo a liberação do FGTS de forma parcimoniosa - afirma França.