sexta-feira, 23 de abril de 2021

Pandemia leva indústria a ampliar contratação de intermitentes

Em 2020, 45% das empresas com intermitentes ampliaram o número de contratos; entre os motivos estão a adequação da força de trabalho à flutuação da produção em um cenário de incertezas e a contratação de trabalhadores com habilidades específicas que não demandam prestação de serviço em tempo integral.

Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que 15% das 523 empresas entrevistadas contrataram intermitentes em 2019 e 2020, e 85% delas pretendem contratar na modalidade em 2021 e 2022.

Além disso, o levantamento revela que o regime intermitente foi utilizado para manutenção dos vínculos formais num contexto de imprevisibilidade trazido pela pandemia. Em 2020, 45% das empresas com intermitentes ampliaram o número de contratos e 44% o mantiveram. Um dos motivos apontados foi a rápida adequação da força de trabalho à flutuação da demanda.

Segundo números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o setor da Indústria gerou apenas 19% das vagas intermitentes entre 2020 e 2021.

A maior parte dos intermitentes da indústria, segundo a pesquisa da CNI, trabalha no chão de fábrica – 67%. Serviços de conservação e limpeza (20%) e de transportes (18%) vêm em seguida.

O contrato de trabalho intermitente é uma prestação de serviços em períodos alternados, e o trabalhador é remunerado de maneira proporcional, somente pelo período trabalhado. Além disso, a prestação de serviços esporádica deve ser registrada em carteira e há direitos trabalhistas previstos como férias e 13º proporcionais e depósito do FGTS.

De acordo com a gerente-executiva de Relações do Trabalho da CNI, Sylvia Lorena, a pandemia trouxe desafios para o planejamento e a gestão da indústria, substituindo as sazonalidades pelos períodos de paralisação da produção e aumento repentino de demanda.

Além de o contrato intermitente permitir adequação a flutuações na produção, 70% das empresas disseram que a modalidade se tornou importante para a manutenção de vínculo com trabalhadores com habilidades e perfil específicos para certas atividades, mas para os quais não há demanda de prestação de serviço em tempo integral. Entre as pequenas indústrias, o percentual chegou a 77%.

Entre as empresas que utilizaram intermitentes, 72% formalizaram no contrato um número mínimo de horas mensais. Os quantitativos de horas pré-contratadas mais comuns são mais de 40 horas mínimas mensais, presentes em 23% dos contratos, e até 8 horas por mês, presentes em 20% dos registros.

Sylvia Lorena explica que esse mínimo de horas nos contratos intermitentes, além de conferir previsibilidade à prestação do serviço, permite às empresas dispor de trabalhadores em período compatível com a demanda de serviço, que tem sido predominante nas áreas operacionais. Isso faz com que o intermitente seja uma alternativa enquanto as empresas seguem com faturamento restrito.

Das empresas que firmaram contratos intermitentes em 2019 e 2020, 60% afirmaram ter empregado entre 1 e 10 trabalhadores na modalidade, enquanto para 29% foram mais de 20 contratos formalizados e em 11% foram entre 11 e 20 vínculos intermitentes.

Insegurança jurídica freia contratações

Mesmo com a pretensão de ampliar a utilização da modalidade, as empresas apontam fatores que reduzem ou dificultam as contratações dos intermitentes.

Metade das empresas ouvidas aponta a insegurança jurídica em relação ao trabalho intermitente. A modalidade, instituída pela reforma trabalhista em 2017, é questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, que aguardam por decisões dos ministros.

Na sequência, vem a própria atividade da empresa que dificulta a contratação em regime intermitente, citada por 44% das entrevistadas.

“As atividades na indústria, por natureza, demandam maior qualificação e capacitação técnica de seus empregados, o que reforça a percepção de que o trabalhador intermitente na indústria tem sido contratado com um perfil ou habilidade específica”, analisa o especialista em Relações do Trabalho da CNI, Pablo Rolim Rolim.

Insegurança sobre se o trabalhador atenderá ao chamado para o trabalho é o terceiro fator que traz receio nas empresas, apontado por 33%.

Indústria gera 19% das vagas intermitentes entre 2020 e 2021

Entre janeiro de 2020 e fevereiro de 2021, foram criadas 80.971 vagas intermitentes, de acordo com dados do Caged. Só em 2020, foram 72.879 postos. A indústria gerou 13.264 vagas na modalidade em 2020 e 2.057 em 2021 – ou seja, 19% do total de vagas intermitentes no período de 14 meses.

Para Pablo Rolim, os dados tanto do Caged quanto da pesquisa indicam que não há substituição do típico contrato de trabalho em jornada em integral, e que "o contrato intermitente cumpre sua função de permitir complementar a força de trabalho para a execução de funções específicas”.

O setor de Serviços foi o que mais criou vagas para intermitentes, com 47.140 postos desde 2020 – 58% do total –, puxado pelas áreas de informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas (29.654 vagas do total).

O período com maior criação de vagas intermitentes foi entre outubro e dezembro de 2020, puxado pela demanda do Natal. No caso da indústria, o aquecimento nas vagas foi pulverizado entre os meses de julho e dezembro.

Em 2020, foram geradas 142.690 vagas formais, puxadas pelos setores da Construção, Indústria e Agropecuária. Das 95.588 vagas com carteira assinada geradas na indústria, 14% foram para intermitentes. Já entre o total de vagas criadas, 51% foram na modalidade intermitente no ano passado – 72.879 de 142.690.

Nos dois primeiros meses do ano, o saldo de vagas com carteira assinada é de 659.780. Juntos, os setores de Serviços e Indústria foram responsáveis por 438.752 vagas. Na indústria, das 185.209 vagas formais criadas, apenas 1,1% foi de intermitentes. No caso de Serviços, a proporção é um pouco maior, de 3,4%. Já entre o total de vagas criadas, apenas 1,23% foi na modalidade intermitente no período – 8.092 de 659.780.

Marta Cavallini, G1, 23/abr