Na hotelaria carioca, a verdadeira competição virá depois das Olimpíadas. Em sete anos, a oferta de quartos em hotéis do Rio mais que dobrou, chegando aos Jogos de 2016 com 62 mil unidades. Lá atrás, quando esse boom do setor de hospedagem teve início - a reboque da demanda dos megaeventos e numa economia em crescimento - a previsão era que a maior capacidade puxaria a taxa de ocupação, a diária média e a receita do setor para cima. Com a crise, e o freio no turismo corporativo, a realidade é outra. No ambiente mais competitivo, avaliam especialistas, a tendência é de ajuste. A tarifa média pode cair e alguns hotéis podem fechar as portas ou mudar de segmento.
- Se as taxas de ocupação começarem a cair, a diária média pode recuar. O Rio sempre teve uma demanda não atendida. Daí, na comparação com o resto do país, as diárias custarem mais - explica Manuel Gama, presidente do Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil (Fohb). - Haverá um ajuste. Quem não atualizar seus ativos e não oferecer serviços à altura da tarifa cobrada será afetado. Uns podem fechar; outros, mudar de atividade.
Ele diz que houve fechamento de hotéis em cidades como Belo Horizonte e Salvador após a expansão da oferta para a Copa do Mundo de 2014.
A ocupação dos hotéis cariocas recuou de 79,08% em 2011 para 72,40% em 2014, de acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Rio (ABIH-RJ). Os números de 2015 não estão fechados. Em novembro, a ocupação ficou em 67%, contra 78% em igual mês de 2014. Ainda que se considere o efeito do aumento da oferta, o total de hóspedes encolheu no período, caindo de 966,9 mil para 834 mil.
- O Rio tinha um turismo corporativo muito forte, responsável por metade da ocupação. A crise derrubou essa ocupação, sobretudo com as dificuldades no setor de óleo e gás e pela crise do grupo "X", de Eike Batista. Os negócios na cidade e no estado minguaram - explica Alfredo Lopes, presidente da ABIH-RJ. - Trabalhamos focados em eventos e no segmento de lazer, que se aqueceu com o movimento de turistas nacionais.
Mesmo datas fortes no calendário carioca, como o réveillon, mostram reflexos da recessão. A ocupação para o ano novo ficou em 83%. Subiu frente aos 80% de 2014 - já com o país em crise - mas está abaixo do resultado de 2013, que foi de 86% e perde para 2012 e 2011, quando as taxas foram de 92% e 95%, respectivamente.
Parte do salto na oferta do Rio vem do fato de a cidade apresentar o melhor desempenho em diária média e ocupação no país. Esse resultado, contudo, talvez seja explicado pela oferta limitada até aqui. Segundo levantamento do Fohb, considerando estabelecimentos associados à entidade, de janeiro a outubro de 2015, os hotéis cariocas tiveram 66,8% de ocupação média, com diárias a R$ 385,70. Nesse período, São Paulo registrou 64,46% de aproveitamento, com tarifas a R$ 267,77, enquanto a média Brasil foi de R$ 61,49%, com preço médio de R$ 240,38.
De um ano para o outro, porém, o tombo foi maior no mercado carioca. Se comparado a janeiro a outubro de 2014, a diária média caiu R$ 61, contra recuo de R$ 1,76 em São Paulo e de R$ 9,60 no Brasil. Em ocupação, o percentual carioca diminui 5,4 pontos percentuais, ante 3,58 na capital paulista e 4,46 na média nacional.
- Os empresários terão de fazer uma atuação de sobrevivência, reduzir despesa, adequar-se ao mercado e compensar em serviço. É preocupante - reconhece Alexandre Sampaio, presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação.
A Barra concentra 35% da expansão de quartos, incluindo marcas estreladas na hotelaria internacional de luxo como Hyatt, Hilton e Trump. E a tarefa de fazer a região decolar na preferência do turista.
- Acreditamos na atração de mais turistas estrangeiros para o Rio, com a abertura de novas atrações e eventos na cidade. E no público que prefere se hospedar em redes internacionais para garantir um padrão de serviço e qualidade - afirma Silvio Araujo, diretor de Marketing e Vendas do Grand Hyatt Rio de Janeiro, que abre na Barra em março.
Laura Castagnini, diretora-geral do Hilton Barra, em operação desde abril de 2015, reconhece que o cenário na indústria hoteleira carioca mudou, mas vê a expansão como aliada ao crescimento mesmo na crise:
- Os megaeventos trouxeram produtos novos, atualizando a oferta, que tinha preços acima da qualidade. Vieram marcas internacionais que colocam um selo de qualidade no destino. Houve expansão na variedade de produtos para todos os orçamentos. O mercado e as tarifas vão se ajustar.
'O CLIENTE MUDOU'
Para Ricardo Mader, diretor da área de Hotéis e Hospitalidade da consultoria JLL para a América do Sul, avalia que o Rio precisava da mudança, mas diz que é um desafio vender a nova oferta:
- A Zona Sul teve expansão menor e isso pode reduzir o impacto nessa área. A Barra, onde o crescimento foi mais forte, pode sofrer mais.
A agenda de eventos é um pilar importante para a hotelaria, sobretudo na Barra. Em 2014, o Rio sediou 154 eventos, totalizando público de 177 mil pessoas e receita potencial de US$ 247,71 milhões, segundo o Rio Convention & Visitors Bureau. Ano passado, foram 302 eventos, com 1,4 milhão de participantes e US$ 1,86 bilhão em receita estimada. O salto é explicado pelo efeito da Copa do Mundo.
- Os hoteleiros, a exemplo do que vem ocorrendo em outros setores, precisam seguir a transformação do mundo devido a novas tecnologias e comportamentos. Vão concorrer com outros hotéis, mas também com o Airbnb. O cliente mudou - pondera Trícia Neves, sócia da consultoria Mapie.
A rede Hotéis Othon trabalha para acompanhar as mudanças. E aposta fichas no turista de lazer.
- Houve desaceleração no segmento corporativo. Temos média de ocupação de 55% (no segmento). Mas a previsão é de um novo quadro em torno de 45%. O turismo nacional vem crescendo. O grupo trabalha com 60% de turistas brasileiros - conta Tomás Ramos, diretor comercial e de marketing do grupo. - Nos últimos anos, investimos mais de R$ 80 milhões no Rio Othon Palace (Copacabana).
A união de esforços deve ajudar. Para o período dos Jogos, a ocupação na cidade já supera os 90%, diz a ABIH-RJ. Já para as Paralimpíadas, ainda está perto de 60%, diz Alfredo Lopes:
- Estamos discutindo com o Comitê Rio 2016 campanha para estimular a vinda de brasileiros.
Gama, do Fohb, lembra que destinos que sediam Olimpíadas registram alta média de 25% em ocupação hoteleira nos anos seguintes.