quinta-feira, 26 de julho de 2018

Destoantes, prédios populares resistem no coração do Leblon


A taxa de urbanização do Brasil é de 85%, uma das maiores do mundo. Está mais do que na hora de os candidatos aos cargos eletivos colocarem as cidades nas suas plataformas. É inadiável a mudança da dinâmica espacial urbana em todo o país, sob pena de continuarmos multiplicando a miséria das periferias que se grudam umas às outras. Esses caóticos aglomerados espalham-se em manchas de habitações precárias, sem infraestrutura de esgoto, coleta de lixo, policiamento, escolas, postos de saúde, áreas de recreação.

Assim, as cidades alargam-se em territórios malcuidados, dependentes de um transporte de longas distâncias, que se realiza por meio de ônibus superlotados ou das ziguezagueantes e arriscadas motocicletas. O espraiamento espacial das cidades é causa da elevada emissão de carbono, da baixa produtividade no trabalho e nos estudos, da desagregação na vida comunitária e familiar. O dia a dia da maior parte do povo resume-se ao trabalho, à espera nos pontos dos ônibus, aos desconfortáveis e extensos deslocamentos em vias esburacadas e congestionadas.

Qual é a alternativa? Em lugar de cidades tão rarefeitas, que tenhamos as cidades compactas, preconizadas pelos mais notáveis arquitetos e gestores urbanos do mundo, como o dinamarquês Jan Gehl, o colombiano Enrique Peñalosa, os americanos Michael Bloomberg e Janette SadikKhan, o brasileiro Jaime Lerner. A característica definidora da cidade compacta é a proximidade entre os locais de moradia, trabalho, estudo, cuidados à saúde, lazer e entretenimento, em uma mescla urbana que contemple praças e parques.

Ao se compactar as cidades, dentro da escala humana, permitem-se às suas bordas respirarem o verde e se banharem nos cursos d'água. Paris é assim. Sua densidade é de 21 mil habitantes por quilômetro quadrado. Barcelona, idem. Tem 17,5 mil habitante/km². As densidades da cidade do Rio de Janeiro e de São Paulo são, respectivamente, de 5, 2 mil habitantes/km² e de 7,3 mil habitantes/km². Ou seja, em Paris há quatro vezes mais habitantes por área urbanizada do que na cidade do Rio de Janeiro, e três vezes mais do que em São Paulo. Na mesma comparação, a densidade de Barcelona é 3,4 vezes maior do que a do Rio, e 2,4 vezes superior à da capital paulista, segundo dados do núcleo USP Cidades, da Universidade de São Paulo.

Paris e Barcelona são cidades compactas, isto é, em grande parte caminháveis. O que nelas prevalece é a mistura dos usos de moradia, trabalho, estudo, lazer etc. Já nas cidades espalhadas, os usos são segregados: mora-se aqui, trabalha-se lá longe, estuda-se alhures.

O tema urbano nunca fez parte das campanhas eleitorais no Brasil, nem mesmo as dos candidatos à Presidência da República, ainda que exista - é bom lembrar - um Ministério das Cidades. E mais: a responsabilidade compartilhada da União quanto ao ordenamento urbanístico inscreve-se num capítulo da Constituição de 1988. Mas, qual é o envolvimento dos políticos com a questão urbana? Pois, então, diante dessa falta de interesse, a gente deve adotar uma nova e firme atitude perante as urnas. Que em outubro rejeitemos os candidatos que não se importam com os rumos das nossas cidades.

Paulo Solmucci é presidente da União Nacional das Entidades de Comércio e Serviços e da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes



O Globo, Opinião, Paulo Solmucci, 26/jul