As vendas de imóveis novos cresceram 15,2% no primeiro semestre deste ano em comparação ao mesmo período do ano passado, com 180.162 unidades vendidas. No acumulado dos últimos 12 meses (de julho de 2023 a junho de 2024) foram 353.949 novas unidades vendidas.
Os motivos apontados pelos agentes do setor são o efeito benéfico da combinação de inflação controlada; redução da taxa de juros (sete cortes consecutivos até junho), aumento na geração de novos empregos e disponibilidade de recursos tanto do FGTS quanto da caderneta da poupança para aplicação em moradia.
Na linha de frente, as vagas de emprego na construção civil também aumentaram, e algumas construtoras já indicam problemas de contração de mão de obra. No primeiro semestre deste ano, o setor criou 180.779 novos postos de trabalho com carteira assinada, segundo dados do Ministério do Trabalho. A construção de prédios corresponde a mais de 40% deste número.
No ano passado, eram 2,66 milhões de trabalhadores formais e a expectativa é que supere os três milhões até o final de 2024. Será o melhor resultado nos últimos dez anos, já que última vez que o setor teve esse número foi em setembro de 2014 .
Sylvio Pinheiro, diretor da G+P Soluções, hub de negócios voltados para a construção civil, analisa que o mercado da construção civil no Brasil está vivendo um paradoxo: de um lado, temos um crescimento impressionante das empresas do setor, do outro, uma escassez de mão de obra qualificada.
– A falta de profissionais já está causando atrasos ou maiores prazos para a entrega de projetos e, consequentemente, aumentando os custos indiretos. Isso impacta fortemente no custo de construção, tornando-a muito mais onerosa do que deveria ser - relata.
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) está fazendo estudos para identificar e confirmar este déficit de mão de obra. A pesquisa Sondagem Indústria da Construção, feita pela CNI, realizada em julho deste ano, mostra que a falta ou alto custo de trabalhador não qualificado foi assinalada por 24,7% dos industriais e ficou em segunda posição no ranking de principais problemas enfrentados pelo segmento. Em comparação ao primeiro trimestre, a dificuldade aumentou 9,9 pontos percentuais. Só fica atrás da preocupação com a carga tributária.
– Quem é entrante no setor, quem é novato, precisa passar por uma qualificação. O setor passou ao longo desses anos por uma transformação nos critérios de produção, nos procedimentos de execução de serviços, nas questões de segurança de trabalho, com muito treinamento, com muita metodologia, então há essa necessidade de trabalhadores mais qualificados - destacou Marcelo Azevedo, gerente de análise econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Marcelo do Nascimento, sócio da Elvas Empreendimentos, construtora responsável pela obra do Niemeyer 360º, projeto da Capital 1 na Barra da Tijuca, relata que tem percebido uma crescente falta de qualificação em profissões como pedreiro, gesseiro e pintor, especialmente agora que o empreendimento está na fase de acabamento.
– A mão de obra que trabalhou comigo há uns 10 anos, por exemplo, já não está mais na construção civil. Muitos desses profissionais migraram para outras áreas e não demonstram interesse em retornar ao setor. Além disso, há uma preocupante escassez de mão de obra especializada, como líderes de canteiros, encarregados e mestres de obra. Os profissionais que ainda estão no mercado, em sua maioria, têm uma boa formação, mas muitos já se aposentaram - explica.
Já Ricardo Affonseca, CEO da Aros, destaca que as questões mais latentes hoje são a falta de mão de obra e o envelhecimento, porque os mais jovens não querem mais trabalhar na construção civil.
Paulo Fabbriani, vice-presidente e conselheiro da B.Fabbriani Incorporadora, considera que é uma situação muito ruim que já está refletindo nos preços dos novos lançamentos de imóveis, especialmente no Rio de Janeiro, em São Paulo e no litoral norte de Santa Catarina, mercados mais acelerados em imóveis na planta nos últimos anos.
– Temos então um cenário de aceleração de custos, com escassez de mão de obra e um crescimento menor da produção de insumos típicos da construção e tudo isso com capacidade limitada de compra. Isso é uma situação muito limitante para o setor - comenta.
Para contornar a dificuldade, o setor já está investindo em novas tecnologias, com a automação de processos, o uso de BIM (Building Information Modeling) e drones para inspeção e mapeamento estão se tornando comuns, explica Pinheiro.
– Além disso, empresas e entidades de classe estão lançando programas de treinamento e qualificação para atrair e preparar novos talentos já sabendo operar as mais modernas tecnologias de construção.
O Globo, 29/ago