Concentrada em São Paulo, locação institucional de apartamentos atrai investimento estrangeiro.
Pesquisa inédita da consultoria imobiliária SiiLA aponta que o mercado de locação residencial para renda, conhecido como “multifamily”, deve crescer 31,5% em número de unidades até agosto de 2025.
O setor já reúne 9,2 mil apartamentos no país, dos quais 30% entregues nos últimos 12 meses, e outras 2,9 mil unidades ficarão disponíveis dentro um ano. Há ainda outras 2,6 mil unidades em projeto.
O diferencial do multifamily para o mercado tradicional de locação de residências é que ele pertence a investidores institucionais, que compram prédios inteiros para alugar. Os aluguéis podem ir diretamente para a empresa que comprou o prédio, e que gere o empreendimento, ou para um fundo de investimento imobiliário (FII) especializado em renda urbana.
O mercado ainda é altamente concentrado no Estado de São Paulo, que tem 89% das unidades em operação. “São Paulo é o maior tubo de ensaio para qualquer tese, mas aprendemos que a demanda existe para qualquer cidade do Brasil”, afirma Giancarlo Nicastro, CEO da SiiLA.
A taxa de vacância do segmento multifamily ficou em 21,26% no segundo trimestre, seguindo a taxa de São Paulo, que foi de 21,4%. Outros Estados que também têm estoque relevante desse tipo de projeto, como Minas Gerais e Rio Grande do Sul, estão com 5,9% e 6% de vacância.
Para Nicastro, a média nacional é considerada alta. Uma vacância “interessante” para o mercado é abaixo de 12%. “Houve acúmulo de entregas e o mercado demora para absorver, mas a tendência é que diminua rapidamente”, diz.
Já faz alguns anos que os primeiros investimentos nesse setor começaram a aparecer, mas concorrer com um mercado difuso de locação, composto por pequenos proprietários e milhares de imobiliárias, não é simples.
Quem investe em multifamily mira no que acontece no mercado americano, onde o segmento é o maior dentro dos FIIs. Por aqui, lembra Nicastro, esse tipo de FII ainda não chega a 1% de participação.
Entre os maiores detentores de unidades multifamily estão negócios abastecidos por capital estrangeiro, como a canadense Brookfield. A empresa anunciou nesta semana a compra de cinco prédios da incorporadora Planta Inc, que reforma prédios antigos e os converte para locação. Tem também um contrato para comprar prédios da Luggo, empresa do grupo MRV&Co especializada em construir ativos para multifamily.
A Brookfield tem 1,8 mil unidades em operação e outras 3,2 mil já dentro do portfólio, em desenvolvimento, conta André Lucarelli, vice-presidente sênior de investimentos em real estate.
Outra empresa do setor, a Vila 11 tem o fundo americano Evergreen como parceiro. Há ainda a marca Ayra, cujos projetos têm recursos de um fundo do Canada Pension Plan Investment Board (CPPIB) e gerenciamento da americana Greystar.
Entre os players nacionais com mais peso está a JFL Living, empresa de Jorge Felipe Lemann, e a incorporadora Vitacon, que tem uma empresa-irmã, a Housi, para gerenciar unidades para locação.
A taxa de juros alta inibe o desenvolvimento nacional desse tipo de ativo, porque é mais desafiador bater a rentabilidade da renda fixa. No aluguel residencial tradicional, a taxa média de rentabilidade está em 5,96% ao ano, segundo o índice FipeZap de julho. Negócios abastecidos por capital estrangeiro lidam melhor com essa perspectiva, e entram com “paciência” para aguardar uma virada dos juros.
Para Nicastro, os investidores brasileiros estão esperando ter mais certeza sobre a taxa de retorno desse tipo de ativo antes de aumentar investimentos na área.
“Temos convicção de que vai pegar aqui, não é uma aposta”, afirma Lucarelli.
O multifamily é mais caro do que um aluguel tradicional. O valor médio do metro quadrado para locação, segundo a pesquisa da SiiLA, é de R$ 169,03 — um imóvel de 50 metros quadrados custaria R$ 8.450 ao mês. Como comparação, o índice FipeZap de julho encontrou um valor médio de R$ 55,96 o metro quadrado para a locação em São Paulo, que reúne a maior parte do portfólio de multifamily.
Os ativos encontrados pela SiiLA são 29% de classe A, 37% de B e 34% de C. Segundo Nicastro, o maior potencial de crescimento no setor está nas classes B e C, cujos aluguéis ficam em torno de R$ 75 a R$ 150 por metro quadrado
Lucarelli afirma que a Brookfield tem conseguido subir seus aluguéis acima do previsto e cobrar até 30% mais do que um aluguel comum em unidade similar.
As unidades da empresa em operação hoje são principalmente voltadas para a classe B, com aluguel de R$ 2 mil a R$ 3 mil, mas a Brookfield já comprou prédios para a classe A.
“Vamos focar em alguns bairros de São Paulo, talvez tenhamos algo no Rio ou outra capital, mas o foco é classe B”, afirma o executivo. É onde enxergam maior ganho de escala.
Para convencer o locatário a gastar mais, os ativos multifamily costumam dispensar fiadores, ter contratos mais flexíveis do que os 30 meses de um aluguel típico e possuir uma gestão “profissional” do prédio, com oferta de serviços de manutenção, por exemplo.
As áreas comuns também são caprichadas. Segundo a pesquisa da SiiLA, 65% dos ativos têm piscina e 96% possuem lavanderia compartilhada. Cozinhas compartilhadas estão presentes em 42% dos prédios, 92% têm sala de coworking e em 87% é possível alugar uma bicicleta.
Os imóveis também são locados mobiliados ou semimobiliados, ao menos com armários, geladeira e fogão. “Pega muito casais que se divorciaram e famílias em formação”, afirma Nicastro, por evitar um gasto inicial com móveis e eletrodomésticos.
Unidades pequenas são mais comuns. De acordo com a pesquisa, 37% têm menos de 30 metros quadrados e 47% têm entre 30 e 50 metros quadrados. O tamanho reduzido evita um custo final alto demais. “Se vou pagar R$ 10 mil de aluguel, pago uma parcela de financiamento, a cabeça ainda acaba sendo essa”, diz Nicastro.
Valor Econômico, 30/ago