segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Imóvel compacto ganha demanda e atrai investidores


Há um ano e meio, após se separar do namorado, com quem vivia em uma casa de 150 metros quadrados, no Jardim Marajoara, na zona Sul da cidade de São Paulo, a fotógrafa de publicidade de moda Ariana Lima, de 35 anos, foi morar em um loft de 29,5 metros quadrados, na Vila Olímpia. O imóvel, incorporado pela Vitacon, especialista nesse mercado, pertence a uma amiga. "A experiência é incrível", diz a fotógrafa. Assim como Ariana, muitos consumidores das classes média, média-alta e alta, principalmente os mais jovens, estão dispostos a trocar áreas maiores por melhores localizações e mais mobilidade.

Os lançamentos de imóveis compactos, com área de 20 metros quadrados a 35 metros quadrados, voltados para as rendas média e alta cresceram 25%, no mercado paulistano, de janeiro a outubro, na comparação anual. Somaram 6.044 unidades, segundo levantamento realizado pela área de inteligência de mercado da Abyara, a pedido do Valor.

"A qualidade de vida das pessoas está cada vez mais relacionada ao tempo que se perde no deslocamento, no dia a dia", afirma o diretor técnico da rede de imobiliárias Lopes, Cyro Naufel.

Após a mudança, Ariana passou a ir a pé encontrar clientes situados na mesma região onde mora, assim como para a academia e para baladas. Para seu estúdio fotográfico, na Lapa, na zona Oeste, o tempo do percurso foi reduzido de até uma hora e meia para 30 minutos de carro. Segundo a fotógrafa, desde que se mudou para o compacto, sua vida se tornou "mais dinâmica e com menos consumo". Agora, Ariana consome menos roupas, sapatos e produtos para casa. A manutenção do espaço onde mora está mais fácil, e é possível encontrar os amigos com mais frequência.

Quem está começando a vida profissional e opta por morar perto do trabalho, quem acaba de se mudar para São Paulo com a finalidade de trabalhar ou estudar, executivos que residem de segunda a sexta-feira na capital paulista e casais jovens estão entre os principais perfis que buscam mais praticidade ao habitar em um compacto, tipo de imóvel que tem sido desenvolvido em regiões com boa infraestrutura de transportes e serviços.

A demanda também se ampliado por parte de recém-separados, de casais cujos filhos saíram de casa e de parte da classe média que vem optando por viver em áreas mais centralizadas, segundo o sócio-diretor da TPA Empreendimentos, Mauro Teixeira Pinto. Os compactos - studios e lofts - respondem por 80% dos lançamentos da TPA.

Dois anos e meio atrás, o corretor Guilherme Malfi se mudou com a noiva de apartamento alugado de 90 metros quadrados, nas proximidades da estação de metrô Vila Madalena, para um loft de 60 metros quadrados, perto da estação Anhangabaú, adquirido da TPA. "É mais fácil de limpar, conseguimos aproveitar o espaço com menos desperdício, e o custo de manutenção é menor", compara Malfi. Mas, se a família crescer, a opção será, segundo ele, por imóvel tradicional, com área de serviço e mais um quarto.

Para Daniel de Aguiar Nascimento, de 25 anos, a possibilidade de reduzir o tempo que gasta para ir trabalhar foi a principal razão que o levou a decidir pela compra, como primeiro imóvel, de um studio de 26 metros quadrados, incorporado pela Mitre, nas proximidades da estação de metrô Guilhermina-Esperança, em vez de adquirir unidade em São Miguel Paulista, onde reside com familiares. Profissional da área de corretagem, Nascimento precisa se deslocar para coordenar equipes em diversas regiões da capital paulista. "Preferi um imóvel menor, mas melhor localizado", diz o corretor, que vai se mudar tão logo a unidade, adquirida na planta, for entregue.

Na avaliação de uma fonte do setor imobiliário, o número de compradores finais de compactos tende a crescer, à medida que os juros caem e uma parcela de clientes que era atendida pelo programa habitacional Minha Casa, Minha Vida passa a ter a renda enquadrada também no financiamento necessário para a aquisição de unidade de médio padrão.

Em alguns projetos de unidades compactas, a parcela de compradores finais é relevante, mas o principal adquirente desses imóveis são investidores, interessados em trocar apostas na renda fixa por rendimentos potencialmente superiores com aluguel. A figura do investidor voltou a ganhar relevância no setor imobiliário com o reaquecimento do mercado imobiliário e com as sucessivas reduções de juros. Do lado das incorporadoras, desde a regulamentação dos distratos, no fim de 2018, há mais segurança para vender imóveis a esses clientes.

A opção de investidores por compactos em relação a outros ativos imobiliários resulta da possibilidade de desembolso menos do que seria preciso para a aquisição de unidades maiores. "Há mais facilidade para alugar ou revender esses imóveis", afirma o presidente da Brasil Brokers, Cláudio Hermolin.

Incluindo investidores e compradores finais, as vendas de um projeto da Cyrela de compactos de médio-alto padrão, lançado no início de novembro, superam 70% do total, patamar acima do esperado para o curto prazo pela companhia. Localizado na Vila Mariana, o empreendimento tem studios e imóveis de um dormitório, com tamanhos de 25 metros quadrados a 47 metros quadrados e preços que variam de R$ 280 mil a R$ 500 mil."Deixou de ser tão importante para as pessoas ter espaços para lavanderia e escritório, dentro de casa, pagando por isso", diz o diretor de incorporação da Cyrela, Piero Sevilla. "Com um tíquete mais baixo, é possível morar em lugares muito melhores", acrescenta o executivo da Cyrela.

Naufel, da Lopes, afirma que uma das vantagens que as incorporadoras encontram ao desenvolver compactos é a possibilidade de cobrar preço de venda por metro quadrado maior quanto menor for a área da unidade.

Há outro motivo para a forte expansão dos lançamentos de imóveis compactos na capital paulista. As incorporadoras buscam conciliar nos seus empreendimentos lançados a demanda de mercado com as regras do novo Plano Diretor e da nova Lei de Zoneamento de São Paulo.

Dessa forma, o número de projetos híbridos - uma mescla de unidades maiores e studios -, tem crescido nos chamados eixos estruturantes da capital paulista - proximidades de estações de metrôs e trens, e de corredores de ônibus. A legislação limita o número de garagens a uma vaga por unidade nessas regiões. Ao lançar parte do projeto como studios sem vaga, as incorporadoras conseguem oferecer mais de uma garagem para apartamentos maiores no mesmo edifício, atendendo à demanda de quem busca essas unidades.

Exemplo desse modelo é um empreendimento lançado, em junho, pela Tegra Incorporadora, em Moema, composto por apartamentos de 157 metros quadrados e duas vagas de garagem, e studios sem vaga. Segundo o diretor de incorporação da Tegra em São Paulo, João Mendes, os compactos responderão por 30% do valor lançado neste ano.

Há dez dias, a incorporadora apresentou ao mercado paulistano um projeto de uso misto, com studios de 26 metros quadrados, unidades de 46 metros quadrados com um dormitório e salas comerciais e lojas na Vila Nova Conceição. Outro projeto misto foram lançados pela empresa neste fim de semana.

No último sábado, a Trisul lançou empreendimento para investidores com 80% de studios de 25 metros quadrados sem vagas de garagem e 20% de apartamentos de 45 metros quadrados com suíte e uma vaga, ao lado da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), na Vila Clementino. Segundo o superintendente de inteligência de mercado e marketing da Trisul, Lucas Araújo, há demanda por locação de unidades com esses perfis por parte de médicos e estudantes da região.

A Nortis Construtora e Incorporadora direciona seus projetos para usuários finais e atua em compactos em menor quantidade, segundo o fundador, Carlos Terepins, com o objetivo de cumprir os parâmetros da legislação decorrente do Plano Diretor.

Segundo Ronny Lopes, sócio da Arquimóvel, empresa que representa incorporadoras na aquisição de terrenos, 2019 é o primeiro ano em que a procura, em São Paulo, de áreas para desenvolver empreendimentos de unidades compactas, com tamanho de 25 metros quadrados a 40 metros quadrados, superou a demanda para outras finalidades.

No mercado, há quem se preocupe com o risco de excesso de oferta dos imóveis compactos, assim como já ocorreu com flats e saletas comerciais. Para se precaver dessa possibilidade, a Trisul tem sido "criteriosa ao decidir onde oferecer esse tipo de produto", segundo Araújo. No entendimento de Alexandre Frankel, fundador da Vitacon, não existe risco de oferta excessiva, pois há demanda pelas unidades, considerando-se o crescimento vegetativo da população e as mudanças dos hábitos de consumo.

Hermolin, da Brasil Brokers, ressalta que imóveis compactos para as rendas média e alta não são produtos que fazem sentido em qualquer mercado, mas apenas naquelas praças, como São Paulo, "que são polos de atração de pessoas de outras cidades, estados e até países". "No Rio de Janeiro, começa a haver movimento de lançamentos de compactos também com foco no investidor", conta Hermolin.



Valor Econômico, Chiara Quintão, 09/dez