A aversão de investidores ao país foi maior do que de outros mercados parecidos com o nosso na pandemia, mostra estudo.
Nos últimos dias, o mercado financeiro tem apresentado números ruins no Brasil, com a perda de valor das ações de empresas na Bolsa de Valores e a desvalorização do real.
Se é verdade que investidor coloca dinheiro no que acredita, na tela do mercado, assiste-se uma crise de confiança no Brasil, com o dólar e a Bolsa de Valores como personagens centrais desse drama.
A cotação da moeda americana não cansa de subir, a R$ 5,42, é um termômetro da saída de dólares do país. Outro sinal de que estamos em baixa é a instabilidade da Bolsa de Valores de São Paulo, derrapando no ano.
“O que está acontecendo no Brasil, é uma saída de capitais. Não é só capital de estrangeiros que estavam no Brasil que estão indo embora. Tanto o estrangeiro quanto o nacional estão com medo do Brasil. Como no começo do ano, a inflação estava mais baixa e a economia estava dando sinais de recuperação. Na sequência, isso melhorou as contas públicas. Então, tinha-se a ilusão de que o Brasil estava relativamente bem”, explicou Simão Davi Silber, professor do Departamento de Economia da USP.
Mas o cenário mudou, afirma o professor:
“Só que depois a inflação disparou. O governo perdendo credibilidade. Ele falseou na regra fiscal querendo parcelar precatórios e, dada a perda de popularidade do governo, a criação de uma Bolsa Brasil - que seria o novo nome do Bolsa Família de maior porte. Então, tudo isso coloca em risco o teto do gasto. Eu diria o seguinte: você tem, vamos dizer, o caldo de cultura perfeito para quem for avesso a isso fugir do Brasil”.
A pandemia trouxe um medo global, mas a aversão de investidores ao Brasil foi maior do que de outros mercados parecidos com o nosso. Um estudo recente comparou a trajetória do real com a das moedas do Chile, México, Rússia, Colômbia e África do Sul.
O teto é o limite para o crescimento do gasto da União. Uma regra para impedir a explosão da dívida pública.
A pandemia trouxe medo global, mas a fuga daqui foi maior do que de outros mercados parecidos com o nosso. Um estudo recente comparou a trajetória do real com a das moedas do Chile, México, Rússia, Colômbia e África do Sul. De janeiro de 2020 para cá, o real descola da trajetória média das moedas desses países.
A moeda brasileira teve a maior perda de valor no começo de março quando o dólar valia R$ 5,82. Depois de um breve alívio, o cenário volta a piorar - uma indicação gráfica de que o principal alvo da desconfiança dos estrangeiros é o Brasil.
“Quando a economia é parecida, a gente deveria assistir a um movimento comum. Um movimento igual. E isso não tem ocorrido. Nós começamos a gastar mais do que os nossos semelhantes. A nossa pandemia ela foi mais longa, ou pelo menos vem sendo, do que a dos nossos semelhtantes”, pontuou o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez.
Pode-se pensar que o valor do dólar só interessa para quem vai viajar. Mas nem precisa atravessas a fronteira para pagar caro por ser brasileiro. Uma viagem até a padaria mostra o efeito da alta do dólar sobre o preço do trigo; até o supermercado, sobre os alimentos; até o posto, a gasolina. A inflação é a primeira conta que a população brasileira paga pela descrença dos investidores estrangeiros. O desemprego é a segunda.
“Quando o país para de investir, ele para de crescer. E quando ele para de crescer, não cria emprego necessário para todo mundo ter para gerar sua renda. Nós estamos criando conflitos, nós estamos criando brigas, nós estamos criando ameaças que não são os problemas reais da economia. O problema real da economia é o poder de compra das pessoas, o que elas conseguem comprar, o emprego delas, o Bolsa Família. Todas essas questões que nós precisamos tratar imediatamente. Todos os outros conflitos foram criados e não precisariam estar nesse momento. As ameaças às instituições, as dúvidas quanto ao futuro, a eleição antecipada, tudo isso gera incerteza e não é necessário ”, disse Ilan Goldfajn, presidente do Conselho Credit Suisse Brasil.
Jornal Nacional, 20/ago