Em discussão desde o fim de setembro pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), a nova Lei de Zoneamento de Curitiba vem provocando debates sobre qual modelo mais adequado às necessidades da cidade, de seu traçado urbano, interesses e sugestões de seus moradores. Entre os temas em discussão, está a flexibilidade da regulamentação, suas vantagens ou não para o desenvolvimento urbano.
Professora de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, Gislene Pereira defende que cidades com leis de zoneamento mais flexíveis não necessariamente se desenvolvem melhor. "Singapura, por exemplo, tem uma fortíssima regulação do uso do solo, associada a uma excelente qualidade urbana. Já a Cidade do Panamá, que tem uma legislação flexível, vive uma péssima qualidade urbana, com exceção da faixa beira mar", destaca.
Professora de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, Gislene Pereira defende que cidades com leis de zoneamento mais flexíveis não necessariamente se desenvolvem melhor. "Singapura, por exemplo, tem uma fortíssima regulação do uso do solo, associada a uma excelente qualidade urbana. Já a Cidade do Panamá, que tem uma legislação flexível, vive uma péssima qualidade urbana, com exceção da faixa beira mar", destaca.
Além disso, a lei do plano diretor vigente em São Paulo, onde está inserido o zoneamento, foi apresentada sob a forma de cartilha, de fácil compreensão para o cidadão comum. "Isso, sem dúvida, poderia servir de referência para Curitiba", opina.
"Nossa prerrogativa quanto à nova Lei de Zoneamento de Curitiba é de que ela seja justa para todas as pessoas que vivem e trabalham na cidade e, desse modo, não penalize a população e toda a cadeia produtiva. Por isso, acreditamos que ela precisa ser bem pensada e debatida", afirma Jacirlei Soares Santos, presidente da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Paraná (Ademi/PR).
Modelos pelo mundo
Segundo definição da urbanista Raquel Rolnik, professora de Planejamento Urbano da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), em artigo publicado no Observatório das Metrópoles, existem duas grandes estratégias de regulação urbanística no mundo: o modelo normativo, bastante usado nos Estados Unidos e Alemanha, e o discricionário, de origem inglesa.
"O primeiro predefine, por texto e mapa, o que um proprietário pode ou não pode fazer em seu terreno, enquanto no segundo é feita uma análise a partir de méritos individuais e consultas a moradores do entorno de cada empreendimento. O principal argumento favorável ao modelo normativo é que ele possibilita uma previsibilidade, garantindo estabilidade ao mercado, uma vez que os parâmetros definidos pela lei somente podem ser alterados em casos excepcionais ou através de novas leis. Além disso, de acordo com seus defensores, ele é mais fácil e barato de ser administrado, uma vez que não requer processos de análise individualizados e complexos", explica Rolnik em seu artigo.
Para os defensores do modelo discricionário, por outro lado, não seria possível reduzir em regras as qualidades dos espaços urbanos, já que dificilmente os conceitos de espaço "agradável" e "bem desenhado" podem ser expressos em apenas uma equação. Além disso, é um modelo que, em tese, respeita mais as diversidades preexistentes nos bairros, possibilitando também maior controle por parte dos órgãos públicos locais e dos moradores do entorno sobre o que é aprovado.
"Londres é um exemplo de zoneamento discricionário. Lá não existe lei de zoneamento. Os planos definem, além do perímetro urbano e o chamado Green Belt, o cinturão verde da cidade, apenas os imóveis e vistas a serem preservados. Fora desses perímetros cada empreendimento passa por análise individual e extensa consulta pública para ser aprovado", destaca a urbanista.
Instrumento de exclusão
Ligada ao Lincoln Intitute of Land Policy - instituição americana que dá suporte para cidades da América Latina e Caribe - a professora Gislene Pereira considera que, por si só, o zoneamento é um instrumento excludente, tendo como princípio a segregação de zonas.
"Está mais do que na hora de se avançar na discussão do zoneamento, pensando em como ir além dos parâmetros construtivos, para trabalhar o resultado deles. Ou seja, o ambiente urbano que resulta da utilização desses parâmetros. Um zoneamento muito rígido, se não estiver associado a uma política urbana com diretrizes claras e legalmente fundamentada, tem grande chance de não ser obedecido. E um zoneamento urbano flexível, se igualmente não estiver associado a uma política urbana includente, tem grandes chances de criar cidades insustentáveis", pontua Pereira.
Os estudos do Lincoln Institute em cidades como Bogotá e Medellín, na Colômbia, apontam experiências positivas de intervenções regulatórias do uso do solo, segundo a professora. "Sobre aplicação do coeficiente básico e unitário, que partem do princípio da igualdade de oportunidades em relação ao uso do solo, a adoção de um coeficiente de construção básico e igual a um significa que em todos os lugares da cidade é possível construir a mesma coisa. Mas, em alguns lugares, seria possível comprar o direito de construir mais".
Segundo Alceu Nascimento, o que desenvolve a cidade é a necessidade do mercado, não a política pública. "É a demanda que cabe no bolso de quem precisa morar e a construção de uma comunidade integrada. Quando a lei de zoneamento não acompanha essa necessidade, aumenta o custo de produção. A forma segue a função, segundo a definição arquitetônica", sintetiza, alertando para a necessidade de Curitiba incentivar uma melhor ocupação dos edifícios centrais para voltar a ser vanguarda em urbanismo.
"Em função do fracionamento da divulgação dos itens que compõem a lei, ainda existem pontos não muito claros que, se não forem definidos nesse momento e deixados para regulamentação posterior, poderão onerar o comprador, prejudicar o comércio e toda a cadeia produtiva por um longo período, até mesmo atrasando o desenvolvimento da cidade", alerta Jacirlei Soares Santos.