O
sonho da casa própria, um dos chavões usados para versar sobre os
anseios do brasileiro, parece não ser mais tão importante para a geração
recém-saída da casa dos pais.
Uma parte desse grupo, mesmo tendo dinheiro suficiente para comprar um imóvel, prefere pagar aluguel.
O
que justifica esse comportamento é a vontade de, numa sociedade cada
vez mais dinâmica, não ter de ficar preso a um endereço por muitos anos,
cenário provável em financiamentos residenciais longos.
É
o caso do administrador de redes Denílson Carvalho Coutinho, 29, que,
desde que saiu da casa da família, no Grajaú (zona sul de São Paulo), há
cinco anos, já está em seu terceiro apartamento alugado.
Ele
teria dinheiro para comprar um imóvel, porém prefere gastá-lo com
viagens e cursos, mas, sobretudo, valoriza a liberdade de poder se mudar
sempre que quiser.
"Eu
prefiro ter mobilidade. Moro em um lugar e, quando se encerra o
contrato de aluguel, posso ir para outro se precisar, se não tiver
gostado muito do bairro. Não fico atrelado a um local só", diz.
As
mudanças de Coutinho se deram por causa de trocas de emprego. Quando
trabalhava na região da avenida Paulista (centro da capital), vivia por
lá. Hoje, seu emprego é no Morumbi (zona oeste) e, por isso, se mudou
para a Granja Julieta, bairro mais próximo, na zona sul.
Para
Laura Kroeff, vice-presidente da Box 1824, agência que pesquisa de
tendências e consumo, especialmente da população jovem, os milletar
nials (geração nascida entre 1980 e 1994) valorizam mais o fácil acesso
aos bens do que a sua posse.
"Há uma preferência pelo uso ocasional das coisas, seja alugando apartamento, carro ou até roupas", diz.
De
acordo com ela, isso está atrelado à percepção de liberdade e a uma
nova lógica da sociedade, mais interligada, em rede, de forma que tudo
pode ser compartilhado com mais facilidade.
É o que diz também André Penha, fundador da imobiliária digital Quinto Andar.
"Para
gerações anteriores, que moram no mesmo lugar por 40 anos, fazia todo o
sentido ter um imóvel. Hoje em dia há mais necessidade de mobilidade.
Você passa a ganhar mais e vai para um lugar mais sofisticado, depois
perde o emprego e precisa ir para um mais compacto. Também muda-se muito
mais de cidade", afirma ele, que mora de aluguel.
Foi
exatamente uma mudança de cidade um dos motivos que levaram a gerente
de suprimentos Thais Proença Bessa Dias, 34, a não querer comprar um
apartamento quando veio do Rio para São Paulo, há cerca de um ano.
"Eu não queria fazer nenhum investimento desse tamanho sem conhecer bem a região", conta.
"Vale
a pena [alugar e não comprar] porque a liquidez de um imóvel próprio é
muito baixa. Não há flexibilidade se eu precisar me mudar", diz.
Thais
vive num apartamento no Brooklin (zona sul de São Paulo), perto do
trabalho, para onde vai a pé. Até por isso, também não tem carro. Por
ora, não pretende comprar nenhum dos dois bens.
"Invisto meu dinheiro, faço minhas viagens, mas não tenho propriedades. Isso vale mais para gerações anteriores", afirma.
Preços de imóveis estão estagnados, mas devem voltar a subir
Num cenário de incipiente recuperação econômica, quem tem dinheiro para investir deveria priorizar a compra de um imóvel.
A opinião é de Flávio Prando, vice-presidente de intermediação imobiliária e marketing do Secovi-SP.
Para
ele, o preço de imóveis em São Paulo, estagnado, passará por uma
recuperação nos próximos dois anos. Ou seja, será mais difícil comprar
em 2020 do que é hoje.
"Quando as vendas dão uma arrancada, o preço dos aluguéis sobe também, então a pessoa pode ficar sem saída", afirma.
Já
Caio Bianchi, vice-presidente do setor de análises do grupo ZAP Viva
Real, afirma que, em muitos casos, comprar ou alugar dá na mesma
financeiramente.
"A decisão das pessoas acaba sendo por aspectos qualitativos", diz.
Mesmo assim, ele reconhece que a procura por locação cresceu nos últimos três anos.
Folha de São Paulo, Dante Ferrasoli, 12/mai