Construtoras já aceitam até carros no pagamento de imóveis. Contra a retração, ganha a criatividade. O mercado imobiliário reage à crise lançando mão de artifícios para desencalhar o estoque de lançamentos. Na luta pelo cliente, vale promover feiras com food truck e até aceitar carros e imóveis usados como parte do pagamento para um novo. Quem ganha? O consumidor.
Na próxima semana, a construtora Even levará a bike food Don Coneone para o estande de venda do empreendimento UP Barra, como parte da campanha promocional "É possível", que também promoveu eventos gastronômicos no Recreio e no Cachambi.
- O objetivo é aumentar vendas, dar mais um motivo para o possível cliente ir ao estande. O resultado tem sido muito positivo - garante o gerente comercial da Even, Luís Felipe Leite Correa, que, mesmo sem falar em números, acredita que este ano será melhor em vendas do que 2015.
- Lançaremos mais dois empreendimentos na Zona Norte e, no segundo semestre, será a vez da Zona Sul - explica Correa, que planeja eventos culturais para promover o prédio, evidenciando o perfil diferente de venda entre as regiões da cidade.
FGTS ENTRA NA NEGOCIAÇÃO
No subúrbio, a Calçada e a PDG prepararam uma ação agressiva para vender as unidades dos condomínios residenciais Viva Penha e Nova Penha: até dia 9, os clientes terão a possibilidade do pagamento da entrada com o próprio carro ou com o FGTS.
- Existem algumas regras para a utilização. A avaliação é feita por uma concessionária de veículos parceira, que dependendo do estado e ano do veículo, pode pagar até 100% da tabela Fipe. Este valor é direcionado para o pagamento da entrada do imóvel. Existe também a possibilidade de se usar o FGTS - explica Andre Dumbrosck, gerente de marketing da Calçada.
Ele enumera os resultados: mais de 200 visitas ao decorado e mais de 150 atendimentos no chat on-line.
- Notamos que a postura do cliente em sentar à mesa com a construtora e negociar condições, benefícios e valores é fundamental para o sucesso de vendas. O entendimento do cliente, de que este é o momento propício para negociar, pode garantir um bom negócio para ambas as partes - explica Andre Dumbrosck.
Para vender 340 apartamentos em nove empreendimentos prontos ou em fase final de construção espalhados por Botafogo, Jardim Botânico, São Conrado, Recreio e Niterói, a João Fortes Engenharia trabalha a campanha "Extremos", com descontos variáveis de acordo com o imóvel.
- É um ano de desafios. Para quem compra, este é o momento ideal, pois, além da liberação de recursos governamentais, há diversas campanhas de incentivo, condições facilitadas para pagamento e empreendimentos prontos, que reduzem sensivelmente a desconfiança da compra - diz o diretor de negócios da João Fortes Engenharia, Jorge Rucas.
Pelos números divulgados pelo site OLX, nos últimos 12 meses (entre fevereiro de 2015 e 2016) houve uma queda de, em média, 12% nos valores de imóveis comercializados por meio de anúncios na plataforma.
- Este é o momento para quem quer comprar imóveis. A grande promoção que o setor está fazendo é reajuste nos preços. A situação atual irá passar, já que o mercado não conseguirá resistir por muito tempo a este valores muito baixos. Hoje a venda é só para a construtora liberar o encalhe e pagar os financiamentos - conclui o presidente da imobiliária Patrimóvel, Rubem Vasconcellos.
Os indicadores da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (ABRAINC-Fipe) registraram o lançamento nacional de 19.390 unidades no período de novembro de 2015 a janeiro de 2016, um recuo de 14,8% face ao mesmo período anterior. No mesmo período, foram entregues 27.869 unidades, um recuo de 39,2% frente ao número de unidades entregues no mesmo período do ano anterior.
- Este ano todo será de queima de estoques para que os lançamentos voltem em 2017 ou 2018 - diz Vasconcellos, que sentencia o fim dos condomínios/clubes residenciais.
- Temos a consciência que os prédios vão ser menores e não serão ofertados 30 mil imóveis por ano como em períodos anteriores. Agora os empreendimentos ficarão em 200 unidades.
AÇÕES PONTUAIS E TEMPORÁRIAS
João Paulo Rio Tinto de Matos, presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (ADEMI-RJ) concorda que estas ações promovidas pelas construtoras são pontuais e temporárias, e apenas uma forma de liberar os estoques.
- O mercado imobiliário também sentiu os efeitos da retração e da queda no poder aquisitivo da população. O imóvel exige um compromisso de longo prazo e o consumidor não se sente seguro, na atual situação, para assumir tamanha responsabilidade. O setor está pronto para voltar com força total, estamos dispostos para a retomada.
A João Fortes, por exemplo, tem novos projetos legalizados, aguardando a melhora das condições de mercado para definir datas de lançamento.
- O foco é concluir o ciclo de entrega dos empreendimentos em construção e a monetização dos nossos ativos - admite Jorge Rucas.
Rucas afirma que as medidas anunciadas pela Caixa Econômica Federal para aquecer o mercado de crédito imobiliário em 2016 deram ânimo extra ao mercado imobiliário, na medida em que aumenta a disposição e o otimismo de compradores.
A Leduca também lançou uma campanha para superar o mercado turbulento. A construtora está aceitando imóveis usados na negociação da compra de um novo. Segundo o diretor da empresa, Paulo Marques, a unidade é avaliada pela própria companhia conforme o preço de mercado e a unidade tem que estar no município do Rio. Na operação, o imóvel usado tem que custar até 50% do novo.
- Começamos a fazer isso no meio do ano passado, com uma alternativa à falta de crédito para os compradores. A gente percebeu que muitos queriam comprar, mas dependiam da venda de um outro imóvel. Com essa estratégia, a gente pode ajudar o cliente na tomada de decisão - comenta ele.
Marques afirma que a estratégia tem ajudado a empresa a alcançar bons resultados em vendas, trazendo de volta a atenção dos clientes que haviam debandado e adicionando segurança às transações.
- Estratégias como esta são capazes de aumentar as vendas e diminuir a possibilidade de distrato, porque o cliente quita o saldo devedor com uma unidade dele - comenta. - Até março de 2015 a empresa tinha vendido R$ 16 milhões. Este ano, estamos com 28 milhões vendido e nem terminamos o mês de março ainda.
Marques, que é vice-presidente da Ademi, já fala até em novo ânimo no mercado. Segundo ele, o quadro já está melhor e deve caminhar para uma situação mais sólida após as Olimpíadas. Apartamentos mobiliados também entram na lista de estratégias adotadas pelas empresas do ramo imobiliário. A Avanço incluiu essa possibilidade em sua cartela de benefícios providenciais. A campanha batizada de "Leva tudo" oferece esse recurso para os empreendimentos na Zona Oeste. São quatro condomínios estão prontos para morar.
- O cliente já recebe a unidade com armários nas cozinhas, nos quartos e no banheiro, além de itens como fogão, geladeira, máquina de lavar, cama, TV, ar- condicionado e blindex. É uma facilidade para quem não quer ter trabalho após fechar o negócio - afirma o diretor da empresa, Sanderson Fernandes.
Fernandes defende que, com o mercado mais retraído, é preciso buscar um diferencial para acelerar as vendas, sobretudo em bairros onde há muita oferta, como Recreio. Segundo ele, a estratégia foi lançada no fim do ano passado e tem proporcionado boas vendas.
- Desde que lançamos a campanha, reduzimos em 50% o estoque nesses empreendimentos. Deu tão certo que vamos expandir para outros - vislumbra o empresário.
O diretor geral da Brasil Brokers Rio de Janeiro, Mario Amorim, destaca que estratégias como essas sempre foram possíveis. Entretanto, nos tempos de mercado aquecido, as empresas não precisavam utilizá- las. Agora, a realidade é bem diferente.
- No ano passado, fizemos um evento em parceria com uma concessionária de carros, em que as pessoas já faziam a negociação completa no espaço, para que usassem o valor de veículo como entrada. Saíam de lá sem o carro, mas com o contrato do imóvel nas mãos - exemplifica Amorim.
HORA DE FAZER BOM NEGÓCIO
Para o consumidor, receber tantas ofertas nunca é algo ruim. Mas toda ponderação é bem-vinda. Para o coordenador do MBA de Gestão de Negócios Imobiliários da Fundação Getúlio Vargas, Pedro Seixas, a dica é verificar qual oferta se aplica melhor ao perfil de quem está comprando.
- É preciso observar todas as alternativas e negociar algo que seja realmente importante para a família. Para quem não quer ou não pode gastar com as despesas relativas aos móveis, por exemplo, um apartamento mobiliado acaba representando uma possibilidade de reduzir gastos - exemplifica.
Uma vez que o cliente esteja bem informado e com metas estabelecidas em seu planejamento, este é, de fato, o melhor momento para quem está disposto a comprar um imóvel.
- Já que o mercado tem mais vendedores do que compradores, temos neste momento uma oportunidade de analisar bem e não deixar de comprar. É um momento muito bom para quem está em busca de oportunidades - finaliza.