O atraso no pagamento das prestações de financiamento tem feito muitos mutuários perderem seus imóveis. O número de retomadas saltou 80,9%, em um ano, somente na Caixa Econômica Federal, que controla cerca de 70% do crédito imobiliário do país. Segundo o banco, em 2015, foram retomados 8.775 imóveis. Já no ano passado, o número passou para 15.881. Em dois anos, 26,6 mil pessoas perderam suas casas. Na prática, com três meses de mensalidades em atraso, o banco pode emitir uma notificação e em até seis meses o bem pode ser leiloado.
— O banco não precisa iniciar um processo judicial para retomar o imóvel, quando se trata de alienação fiduciária. Por isso, ao primeiro sinal de que não vai conseguir fazer o pagamento em dia, é preciso correr e pedir uma renegociação — explica Lízia Jacintho, presidente da Associação de Mutuários (AmuRio).
De acordo com dados do Banco Central, mais de 233 mil contratos de financiamento estavam com três mensalidades em atraso, em março. O engenheiro Almir Carvalho, de 62 anos, tinha uma situação econômica confortável quando assinou contrato de 25 anos para financiar a casa. O pagamento foi feito em dia por 10 anos, mas com a aposentadoria sua renda caiu 20%, e ele atrasou quatro parcelas.
— Fiz um esforço para pagar o atrasado. O próprio gerente da Caixa orienta para evitar a perda do imóvel e todo investimento que fez até ali, ainda que tenha que vender o imóvel ou fazer uma troca — disse Almir.
O aumento da inadimplência foi acompanhado pelo volume 9,2% menor de crédito, em março, segundo a Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). Em 12 meses, o recuo é de 26,7%.
Contratos com seguro podem ser salvos
A renegociação da dívida com o banco é a primeira providência para evitar a perda definitiva do imóvel . O ideal, segundo advogados, é que o contato seja feito sem que haja parcelas em atraso e, dependendo do caso, é possível recalcular o saldo devedor aplicar o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na transação(veja as orientações na tabela acima).
— Sugerimos que o mutuário leia o contrato com atenção porque muitos não sabem, por exemplo, que possuem o seguro SGHab, e ele cobre até 36 meses prestações em caso de desemprego ou redução salarial. É preciso fazer uma comunicação ativa ao agente financeiro — orienta a advogada Lízia Jacintho.
A maioria dos financiamentos são realizados em 30 anos, mas a quitação, pelo cliente, acontece em média em 12 anos (equivalente a 36% do prazo total), segundo dados da Caixa.
— Em algumas renegociações, o banco aumenta o prazo e reduz a prestação. Se a pessoa já está atrasada embute nas prestações no final. A outra solução é entrar com algum tipo de ação para travar este tipo de leilão — diz o advogado especializado em direito imobiliário Hamilton Quirino.
A Caixa informou que mais de 90% dos contratos renegociados são liquidados dentro do prazo e que os dados demonstram a preocupação dos clientes em cumprir com suas obrigações, mesmo em dificuldade financeira.
Depoimento: advogado José Alfredo Lion, do escritório Lion Advogados
“Para assinar o contrato, o consumidor tem que ter certeza de que vai conseguir cumprir. Mas isso é difícil porque são financiamentos muito longos, geralmente de 30 anos. Hoje, a pessoa tem recursos, mas depois fica desempregada, ou sofre uma redução de renda, tem problemas de saúde. O consumidor deve abrir a negociação, mas não deve assinar se as condições não forem boas. O mutuário também pode recorrer à Justiça e o Poder Judiciário está bastante sensível. O processo pode ser uma ação revisional de contrato, baseada na teoria da imprevisibilidade, ou seja, em eventos que não poderiam ser previstos mas que impediram o pagamento.”
EXTRA, Pollyanna Brêtas, 14/mai