Em seu relatório anual sobre a economia brasileira, o Fundo Monetário Internacional (FMI) afirmou que a recessão brasileira parece estar próxima do fim, mas que o avanço da incerteza política pode comprometer o cenário. A avaliação é que há muitos sinais de estabilização da economia, mas que está mais incerta a capacidade de o governo concluir a reforma da Previdência, necessária para a sustentabilidade fiscal. O documento ainda reduz a projeção para o crescimento da economia em 2018 para 1,3%, ante a estimativa de abril de 1,7%, e eleva a expectativa para este ano de 0,2% para 0,3%.
"Embora o fim da recessão pareça estar à vista, um recente aumento da incerteza política trouxe uma sombra ao cenário. A habilidade de o governo promover a reforma da Previdência - passo necessário para assegurar a estabilidade fiscal - ficou mais incerta e, com as eleições de 2018, a janela para a ação legislativa está se fechando", afirmou o relatório, divulgado ontem.
As projeções do Fundo para o desempenho da economia brasileira consideram um cenário de aprovação de "um conjunto suficientemente forte de medidas" que possam assegurar a sustentabilidade fiscal, o que inclui a reforma da Previdência. A estimativa do FMI é de uma "recuperação moderada", com aumento de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano - ante 0,2% anteriormente - e de 1,3% em 2018 - abaixo do 1,7% previsto antes. A médio prazo, o crescimento atingiria 2%.
O cenário leva em consideração que serão aprovadas mudanças de algum tipo na Previdência até o ano que vem, mas também incorpora algum risco de saída do presidente Michel Temer, já que o documento foi concluído com as informações disponíveis até 20 de junho. A visita da equipe do FMI ao Brasil para a elaboração do estudo terminou pouco depois da divulgação da delação de Joesley Batista, da JBS, envolvendo Temer.
CENÁRIO APRESENTA DÚVIDAS
Por trás das revisões do FMI para o desempenho do PIB brasileiro, há duas razões. De um lado, a incerteza política compromete as decisões de investimentos e consumo. Do outro, há a interpretação de que, apesar de um crescimento maior do que o esperado no primeiro trimestre, seu perfil deixa dúvidas sobre o movimento seguinte. A leitura é que o resultado se deveu muito mais ao agronegócio e que investimentos e consumo permanecem fracos.
"Instabilidade política e desdobramentos da investigação de corrupção são grandes fontes de risco, que podem ameaçar a agenda de reformas e a recuperação. O principal risco político é que a reforma da Previdência seja diluída de forma severa ou adiada para o próximo governo, gerando uma reação adversa do mercado a curto prazo e exigindo medidas fiscais adicionais", diz o documento.
A avaliação do FMI é que, quanto mais tempo demorar a aprovação da reforma da Previdência e quanto mais diluídas forem as mudanças, maior é a chance de uma reação mais forte do mercado.
A reforma trabalhista foi avaliada de forma positiva, especialmente por reduzir o excesso de processos na Justiça, mas também por trazer, a longo prazo, mais estímulos para a criação de empregos.
Apesar de se concentrar mais nos riscos internos, o FMI também citou os externos, como um aperto das condições financeiras globais e, com uma menor probabilidade, uma desaceleração significativa da China. A leitura, no entanto, é que esses riscos externos não são tão fortes.
O FMI ressaltou que assegurar a sustentabilidade fiscal é prioridade chave e que o governo está correto na sua estratégia. A situação da Previdência está em um "caminho insustentável", segundo o FMI, e teria de ser solucionada mesmo que não houvesse um problema fiscal mais amplo. A despeito dos elogios ao teto de gastos, a interpretação dos diretores do FMI é que são necessários mais esforços para as metas fiscais serem atingidas:
"Diante dos desafios que a economia enfrenta, os diretores em geral apoiam o atual ritmo de ajuste fiscal, mas enfatizam que o esforço fiscal necessário terá de ser mais intenso à medida que a recuperação ocorra. Um arcabouço fiscal de médio prazo pode ajudar a clarear e atualizar o desenvolvimento de soluções duráveis em coordenação com os estados".
A expectativa é que o pior momento da situação fiscal seja nos anos de 2022 e 2023, com um déficit de 9,3% do PIB, para só depois começar a desacelerar. O cálculo do FMI, no entanto, é feito por uma fórmula diferente da adotada pelo governo brasileiro.
O documento aponta que a política monetária tem sido "calibrada de forma apropriada" e sugere que se dê continuidade à redução das taxas de juros.
RIO: OUTRO PACOTE DE AJUDA
O Fundo dedicou parte do relatório a dois estados com a pior situação fiscal do país: Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Segundo o FMI, o pacote de ajuda acertado com o governo federal em janeiro não bastará para estabilizar as finanças do Rio: "Sem reformas para limitar o crescimento estrutural de salários e aposentadorias, permanecerá um grande déficit fiscal, e um novo pacote (de ajuda) será necessário em 2020."
Sobre o Rio Grande do Sul, um empréstimo de curto prazo pode equilibrar as contas. Mesmo assim, diz o FMI, são necessários ajustes de longo prazo para garantir a sustentabilidade das finanças do estado.