quarta-feira, 13 de maio de 2020

Ata discute limite para corte de juros, mas sinaliza nova redução


O Banco Central (BC) discutiu os limites para a queda da taxa básica de juros no atual ciclo de distensão monetária, mostra a ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada na manhã desta terça-feira. Mesmo assim, o colegiado reforçou a mensagem de que pode promover em seu próximo encontro, marcado para junho, um novo corte de juros, não maior do que o 0,75 ponto percentual feito na semana passada. A Selic está atualmente em 3% ao ano e vem testando mínimas históricas desde o fim de 2017.
"O comitê discutiu a potencial existência de um limite efetivo mínimo para a taxa básica de juros brasileira", disse a ata, que detalha os debates feitos no último encontro. O documento mostra, no entanto, que não há unanimidade dentro do colegiado a respeito do assunto. Para a maioria dos membros, o prêmio de risco cobrado dos países emergentes faz com que o possível limite para o corte de juros seja "significativamente maior" do que em economias desenvolvidas.
A ata ressaltou, contudo, que esse prêmio tende a ser maior no Brasil, em função de sua relativa fragilidade fiscal e das incertezas quanto à sua trajetória fiscal prospectiva. "Nesse contexto, já estaríamos próximos do nível onde reduções adicionais na taxa de juros poderiam ser acompanhadas de instabilidade nos mercados financeiros e nos preços de ativos."
Mas essa percepção não é um consenso dentro do colegiado. De acordo com a ata, um dos oito membros que participaram da reunião "argumentou que, em princípio, não há razão para a existência de tal limite mínimo operacional, já que os tradicionais canais da política monetária continuariam operantes, sem descontinuidades". Esse mesmo membro argumentou, contudo, que a variação da Selic "possivelmente" já tem um efeito maior sobre os preços de ativos financeiros. "O comitê como um todo reconheceu a importância de gradualismo na condução da política monetária para avaliação da resposta dos preços de ativos financeiros", destacou a ata.
O comunicado divulgado na semana passada, logo após a reunião, mostrava outra divisão de opiniões importante dentro do grupo. Na ocasião, dois membros ponderaram que "poderia ser oportuno" realizar de uma única vez um corte maior da Selic. Entretanto, "foi preponderante a avaliação de que, frente à conjuntura de elevada incerteza doméstica, o espaço remanescente para utilização da política monetária é incerto e pode ser pequeno", disse mensagem do comunicado repetida na ata. Assim, o Copom optou de maneira unânime pelo corte de 0,75 ponto, "com o benefício de acumular mais informação até sua próxima reunião" e decidir sobre o corte adicional sinalizado.
Outro ponto discutido no encontro da semana passada, de acordo com a ata, foi uma possível interrupção na queda taxa de juros estrutural da economia - aquela que permite o máximo de crescimento da atividade sem gerar pressões inflacionárias. Para o Copom, as expectativas dos agentes econômicos a respeito da trajetória das contas públicas têm reflexos sobre essa taxa.
Mais uma vez, o colegiado voltou a alertar para os riscos de possível deterioração do quadro fiscal. "A interação da deterioração do cenário externo com frustrações em relação à continuidade das reformas e possíveis alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas pode ameaçar o processo de queda dos juros estruturais", afirmou.
Apesar das piores perspectivas fiscais, o choque desinflacionário causado pela contração da demanda levou a um processo de revisões para baixo nas estimativas de inflação, segundo o Copom. Tanto no caso da pesquisa Focus quanto nas expectativas implícitas nos títulos públicos, as projeções caíram para baixo da meta, "em particular" para 2021.
A meta estabelecida para o ano que vem, considerado pelo BC o horizonte relevante para a política monetária, é de 3,75%. "O Comitê reafirma seu compromisso com a meta para a inflação estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional, que sempre foi e segue sendo o principal objetivo da política monetária", afirmou.
A retomada da atividade econômica no Brasil, por sua vez, tende a ser vacilante e mais lenta do que o esperado, a não ser que haja avanços médicos no combate à pandemia, segundo o BC. "É plausível um cenário em que a retomada, além de mais gradual do que a considerada, seja caracterizada por idas e vindas", disse. Por enquanto, os poucos dados disponíveis para abril já oferecem "evidência suficiente de que a economia sofrerá forte contração no segundo trimestre". O cenário básico do Copom é de "forte queda" do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro semestre, com recuperação gradual a partir do primeiro trimestre.
"Projeções apontam para uma recessão global com poucos precedentes históricos", disse o BC a respeito do cenário externo "desafiador" para economias emergentes. "Em contraste com outras crises mais recentes, em que o epicentro estava localizado no Hemisfério Norte, nessa ele se desloca para todos os países, juntamente com a pandemia."
Esses dois fatores ajudam a explicar a saída de capitais vista nos mercados emergentes "significativamente superior" ao que foi visto em crises anteriores. As economias com situação fiscal mais vulnerável devem ser as mais prejudicadas, segundo o Copom.
Por fim, o colegiado reforça a mensagem que pode promover em seu próximo encontro, marcado para junho, um segundo corte de até 0,75 ponto na Selic, a depender da evolução do quadro.
"Para a próxima reunião, condicional ao cenário fiscal e à conjuntura econômica, o Comitê considera um último ajuste, não maior do que o atual, para complementar o grau de estímulo necessário como reação às consequências econômicas da pandemia da covid-19", diz. "No entanto, o comitê reconhece que se elevou a variância do seu balanço de riscos e ressalta que novas informações sobre os efeitos da pandemia, assim como uma diminuição das incertezas no âmbito fiscal, serão essenciais para definir seus próximos passos."


Valor Econômico, Finanças, 13/mai