O Banco Central (BC) anunciou um pacote bilionário para destravar a oferta de crédito para pequenas empresas e famílias. Entre as medidas, que somam R$ 270 bilhões, liberou até o uso de imóvel já financiado para fazer um novo empréstimo.
Quem financiou um imóvel de R$ 500 mil, por exemplo, e já pagou R$ 400 mil, poderá ir ao banco e pegar "de volta" parte desse valor já pago nas mesmas condições do contrato original de financiamento imobiliário.
É como se fosse uma repactuação do contrato. Se sua taxa de juros é de 8%, essa será a taxa do novo empréstimo. Essa nova modalidade vale para famílias e empresas.
Segundo o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, em um momento extraordinário como o atual, essa é uma medida que favorecer muito as famílias que estão endividadas ou com problemas temporários em função da pandemia.
A grande vantagem dessa modalidade de financiamento é a taxa de juro, que gira entre 8% a 10% ao ano, contra cerca de 250% do crédito pessoal.
Campos Neto explicou que até o fim da semana será editada uma medida provisória (MP) detalhando essa nova modalidade. A expectativa é que até R$ 60 bilhões sejam liberados.
No segmento de pequenas e médias empresas, as ações do BC podem ser vistas como uma resposta às críticas de que o dinheiro não chega a quem precisa.
Uso das reservas
Com alterações em depósitos compulsórios e outras regras técnicas, o BC busca reduzir a resistência do setor financeiro em conceder esses empréstimos.
- O BC tem um entendimento que as medidas já anunciadas serviram para manter o crédito crescendo, mas também entende que grande parte dos recursos foi para empresas grandes. Todas as medidas que anunciadas hoje são medidas que tem direcionamento para pequenas, médias e microempresas - disse Campos Neto.
A primeira medida anunciada pelo BC permite que as instituições financeiras deduzam dos depósitos compulsórios - recursos que os bancos precisam manter em reservas e, por isso, não podem dispor para oferecer crédito - os valores emprestados para financiamento de capital de giro para empresas com faturamento anual de até R$ 50 milhões.
Dessa maneira, o BC espera que o crédito possa chegar para os pequenos empresários. A expectativa de liberação é de R$ 55,8 bilhões.
O maior potencial de liberação de crédito, de R$ 127 bilhões, vem de um programa chamado Capital de Giro para Preservação de Empresas (CGPE). Aqui, o BC mudou uma regra para os gastos com provisão, dinheiro que o banco tem de reservar como um seguro contra eventual calote, liberando capital que pode virar empréstimos para empresas com faturamento até R$ 300 milhões.
Redução de exigências
O BC também fez outra mudança regulatória que diminui alguns requerimentos de capital para bancos pequenos e tem o potencial de liberar até R$ 12,7 bilhões em crédito.
E por meio de mudanças regulatórias para pequenas instituições financeiras, como cooperativas, o BC espera que sejam concedidos outros R$ 16,5 bilhões de crédito.
- O interessante dessa medida é que esse tipo de instituição geralmente trabalha com pequena e média empresa, então atende claramente aos objetivos desse conjunto de medidas - disse o diretor de Regulação do BC, Otávio Damaso.
Segundo Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, todas as iniciativas anunciadas até agora são complementares e ajudam a elevar a liquidez em um momento de consumo baixo e poucas perspectivas de crescimento.
- Essas iniciativas tendem a aumentar o volume de empréstimos às empresas menores. Também destacaria a regulamentação que permite ao Banco Central comprar títulos privados de micro, pequenas e médias empresas, como debêntures. Isso vai permitir maior circulação de dinheiro - afirmou Agostini.
Atuação de bancos públicos
Já Lauro Gonzalez, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da Fundção Getulio Vargas (FGV), disse que as medidas ajudam de forma marginal.
Ele lembrou que a estimativa de necessidade de crédito entre microempreendedores, pequenas e médias empresas é de R$ 200 bilhões, de acordo com pesquisa feita pelo seu grupo de pesquisa da FGV.
- As ações do Banco Central tentam criar incentivos para que o setor bancário melhore sua atuação. Mas as instituições financeiras têm espaço para aumentar o seu volume de crédito e não o fazem. As iniciativas são boas, mas não sei até que ponto são suficientes. É o caso do uso de imóvel como garantia para levantar mais crédito. Ajuda, mas na margem - destacou Gonzalez.
Para ele, o ideal é que o governo use bancos públicos de forma mais eficiente:
- Os bancos públicos precisam atuar de forma mais ativa e assumir mais risco.