segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Análise: dados indicam 2023 difícil, e atritos com o mercado não ajudam

Governo precisa de apoio do Congresso e dos setores econômicos para passar reformas e melhorar a situação da economia do país.

Os últimos dados sobre a economia em 2022 ainda estão saindo, mas sugerem um cenário difícil para este ano. Na última semana, o IBGE mostrou que a produção industrial fechou o ano passado no vermelho – e ainda não recuperou sequer o patamar de antes da pandemia.

No começo de janeiro, o mesmo IBGE mostrou que a inflação começou a perder força mas, mesmo assim, estourou a meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional. Pelo terceido ano seguido.

Na quinta-feira, vamos ficar sabendo como foi o ano no comércio e, no dia seguinte, dos serviços. Este último vem mostrando dados mais animadores. Mas do primeiro espera-se um resultado ‘blasé’.

Os números do PIB fechado vão demorar mais um pouco, e devem mostrar que a economia cresceu por volta de 3% no ano passado. O resultado, se confirmado, é positivo, ainda mais diante do usual desempenho pífio do Brasil. Mas é nos detalhes que mora o diabo: desde o início do ano passado, o PIB tem desempenho pior a cada trimestre. A economia entrou em 2023, portanto, desengatada (para não falar em marcha à ré).

No lado positivo, o governo nunca arrecadou tantos impostos quanto no ano passado – embora os motivos que levaram a esse reforço nos cofres públicos não devam se repetir. E o desemprego, mesmo que a passos lentos, vem caindo.

É preciso contar tudo isso para explicar porque ainda vai piorar antes de melhorar.

Porque a inflação em queda vai reduzir a arrecadação este ano, e impedir a queda dos juros. E os juros altos vão seguir esfriando a economia.

Para completar o quadro, o presidente Lula, que poderia ajudar colocando ‘panos quentes’ nas relações com essa entidade chamada mercado parece não fazer qualquer questão de apaziguar a situação.

Foi assim na semana passada, quando Lula ‘ameaçou’ a independência do Banco Central, e gerou calafrios no mercado. Foi assim quando ele criticou a meta de inflação; quando criticou a taxa de juros; e quando disse que o BNDES vai voltar a financiar projetos em países vizinhos.

Lula assumiu a presidência em um ambiente de conflito (que só fez crescer após a tentativa de golpe em janeiro), e é compreensível que tenha um posicionamento mais bélico. Mas ele não está facilitando do trabalho do seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Ainda este ano, Haddad quer conseguir a aprovação de uma ampla reforma tributária, que pretende instituir o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que vai simplificar a complexa estrutura brasileira e turbinar os cofres públicos. Para isso, vai precisar de (muito) apoio, do congresso, da população e dos diversos setores da economia – que, por sua vez, não são grandes fãs da insegurança que Lula tem gerado.

Se tudo der certo, este ano ainda podemos ter a reforma do imposto de renda. Promessa de campanha do presidente, a isenção para quem ganha até R$ 5 mil mensais foi colocada na geladeira, sob a desculpa de que ela só poderia valer a partir do próximo ano. Legalmente, isso não é verdade – toda redução de impostos pode começar a valer imediatamente. Mas, na prática, o imposto só pode cair de um lado se subir de outro, sob pena de causar mais um rombo no orçamento público. E ninguém parece disposto a pagar mais.

Com o mundo ainda em crise, juros altos por todo lado e uma guerra em curso, vai ser preciso muito empenho e menos conflitos para passar as reformas que o governo pretende antes de deixar o caldo entornar de vez.

Laura Naime (editora responsável pela cobertura de economia do G1), G1, 06/fev