sexta-feira, 23 de maio de 2014

Mercado do aluguel do Rio enlouquece em antecipação à Copa


A mansão de três andares com paredes de vidro do ex-executivo da indústria da moda Arif Noor foi construída num morro tão íngreme no Rio de Janeiro que seus terraços parecem flutuar acima do mar. Um jardim vertical com flora tropical rodeia um spa suntuoso no térreo. Numa manhã ensolarada recente, uma atriz e modelo visitava a casa para uma sessão de fotos.

O imóvel com cinco quartos e oito banheiros pode ser seu durante a Copa do Mundo - por US$ 150.000 (R$ 333.000) por semana.

O Ministério do Turismo brasileiro prevê que o grande evento do futebol mundial, que começa no dia 12 de junho e será realizado em 12 cidades em todo o país, leve 3,1 milhões de turistas brasileiros e estrangeiros aos jogos e às festas organizadas pela Fifa, conhecidas como Fan Fests.

O Rio deve ser o principal destino, com 554.000 visitantes, e os proprietários de imóveis da cidade se apressam para tirar vantagem. Algumas residências de luxo no Rio de Janeiro já foram reservadas para todo o mês do torneio por centenas de milhares de dólares, dizem agentes imobiliários locais.

O maior negócio fechado para a Copa do Mundo até agora, feito pela WhereInRio, agência imobiliária especializada no setor de luxo e que administra a mansão de Noor, é de cerca de R$ 1,5 milhão para o aluguel de uma cobertura de três andares em Ipanema durante o torneio, diz o proprietário da agência, Frederic Cockenpot. Ele não quis identificar o locatário ou proprietário do imóvel, observando que a discrição é a chave para fazer negócios com clientes ricos. Mas Cockenpot revela que, na sua lista de clientes para a Copa do Mundo, está um chefe de Estado africano e sua equipe de assessores com 30 pessoas. Ele diz, porém, que sua empresa tem como alvo clientes corporativos, porque eles são mais propensos a reservar um imóvel por um mês inteiro.

O burburinho sobre acordos lucrativos desencadeou uma verdadeira corrida entre os proprietários de imóveis para atrair fãs de futebol muito ricos e dispostos a pagar o que for necessário por boas acomodações.

"Todos os dias, recebo de 10 a 15 telefonemas de pessoas procurando casas para alugar", diz Sven dos Santos, empresário alemão de 33 anos que adotou o Rio como residência e cuja empresa imobiliária, a Agência Heidelberg, administra cerca de 180 imóveis de aluguel na cidade.

Em seu portfólio há uma cobertura de 320 metros quadrados e três quartos em Copacabana. A uma quadra da praia, com vista para o mar, o imóvel tem uma sala de estar arejada e uma ampla varanda com banheira de hidromassagem. Ele diz que o apartamento já está alugado para a maior parte do torneio, mas ainda tem uma semana disponível, por aproximadamente R$ 27.000.

A alta demanda elevou os preços de imóveis em todos os níveis e tem estimulado uma concorrência questionável. Alguns albergues da juventude estão cobrando US$ 100 ou mais a diária por apenas uma cama de beliche. Os sites de aluguel estão cheios de propriedades nada luxuosas a quilômetros de distância das áreas turísticas conhecidas. E tudo é válido, de locais para acampamento, casas em muitas favelas da cidade até motéis.

A alta dos preços afastou os turistas regulares e viajantes de negócios. Agora, com a aproximação da Copa, alguns imóveis não estão sendo alugados e os agentes informam que os preços dos aluguéis estão caindo.

O mesmo ocorre com as diárias dos hotéis. Em janeiro, os hotéis do Rio cobravam, em média, US$ 650 (R$ 1.440) a diária na noite do encerramento da Copa, em 13 de julho. Em maio, o preço havia caído 41%, segundo o website Trivago.

Mas os preços das opções de luxo continuam em alta, dizem os agentes imobiliários. Seus proprietários podem ainda esperar por negócios lucrativos.

Noor é um deles. Ele vendeu sua antiga mansão em Los Angeles para o ator Ashton Kutcher por US$ 8,46 milhões, segundo documentos públicos, e conta que comprou a casa no Rio para alugar parte do tempo. Mas, além do aluguel, ele diz que quer ter a certeza de que os locatários apreciem a propriedade. "Eu recusei muitas ofertas", diz ele. "Se você tem uma casa especial, precisa de uma pessoa especial."

Seus locatários - e muitos outros que vierem ao Rio - terão de enfrentar uma série de inconveniências do lado de fora de suas mansões. A Estrada do Joá, que liga a casa de Noor, no morro, às praias, restaurantes e vida noturna da cidade, por exemplo, é acidentada e cheia de buracos. O trajeto de quase dez quilômetros até Leblon e Ipanema é sujeito a um trânsito intenso.

Problemas desse tipo, e o contraste da abundância no meio da pobreza, têm levado milhares de brasileiros às ruas para protestar contra a Copa do Mundo, que eles consideram ter sido organizada à custa de investimentos públicos extremamente necessários em infraestrutura, saúde e serviços.

Para os visitantes endinheirados, uma longa lista de amenidades foi acrescentada para tornar o negócio mais atraente. A agência WhereInRio oferecerá transporte em helicópteros para os eventos, além de iates, passeadores de cães e serviços de spa.

Cockenpot diz que sua agência enfrenta um desafio adicional no Rio: encontrar geradores de energia de reserva. A pior seca em décadas baixou as reservas das hidrelétricas do país. O governo diz que não haverá racionamento de energia, mas a possibilidade levou Cockenpot a fazer provisões. "Os russos, em especial, são muito exigentes", diz. "No Brasil, é difícil achar uma propriedade nos níveis da Riviera Francesa, então eles não entenderão se faltar energia também."



Valor Econômico, The Wall Street Journal, 23/mai